VIVA O ROCK RURAL-
Por Tavito
A primeira vez que ouvi a expressão
“rock rural” foi numa canção de minha própria lavra – em parceria com meu
amigo-irmão Zé Rodrix – aquela que Elis tornou clássica quando a interpretou,
magistralmente, nos anos setenta: a famosa “Casa no Campo”. O marco inicial do
estilo que se tornaria uma vertente da canção brasileira foi, como tantos
outros, um prurido de puríssima coincidência, nascido da genialidade de um
pensador atento e de contornos muito mais abrangentes do que sua própria construção
sugere.
Zé Rodrix fala de uma geração exaurida pelos grilhões da ditadura militar
e pelos descalabros internacionais de uma falida guerra no longínquo Vietnam, onde
sucumbiam todos os seres humanos sobre a terra, sem exceção. Por aqui, atuavam jovens
aguerridos e armados de seus sacrossantos ideais libertários, estes que nem
sempre desaguavam em filosofias pacíficas; uma juventude que promoveria,
segundo o poema, o seu próprio êxodo, despregando-se do meio cosmopolita para
dedicar-se às simplicidades mais primevas dentro do conceito proprietário de
seu destino, desfazendo-se da cosmópole opressora e criando um bucólico poleiro
filosófico repleto de livros, onde todo o pensamento universal poderia
descansar, independentemente de sua geografia demográfica.
Uma luz na
escuridão, um bordão único em todos os sentidos, para abrigar a esperança funcional
que se mune dos óculos da inteligência, esperança esta sem a inocência do
binômio “Paz e Amor” hippie (já que pressupunha alguma propriedade), mas
igualmente tônica e motivo central do comportamento humano. Coincidentemente, Rodrix
criou um quadro, um panorama que é também o sonho recôndito de qualquer cidadão
oprimido pela magnitude às avessas da megalópole fervilhante. Coube-me apenas
musicar seus escritos.
O
espetáculo “Viva o Rock Rural” é uma homenagem ao estilo; apresenta Sá e
Guarabyra, companheiros de estrada de Zé Rodrix, que perpetuaram através dos
anos uma leitura única dos assuntos mais variados, forrando com suas violas e
guitarras o inexorável tempo – esse que só faz passar e nos deixar aflitos –
costurando abordagens únicas a qualquer tema, do amor à guerra. Com eles, o
compositor e instrumentista, expoente dessa mesma geração, integrante da banda
14 Bis – que tão bem canta o bucolismo mineiro fortemente atrelado ao vigoroso
pop universal – o excepcional Cláudio Venturini, guitarrista de mão cheia,
compositor de brilho pleno e amigo de tantas jornadas. Por fim, some-se a estes
o que ora constrói estas maltraçadas, um Tavito renovado pelo galope do tempo,
disposto a misturar e somar sonoridades, idéias e amigos, num tremendo trelelê
musical com muito humor, pois que este é um artigo de primeiríssima necessidade
nos tempos que correm.
Permito-me dizer que é um espetáculo imperdível, um
longo abraço de um passado recente a um presente sempre turbulento e a um
futuro alvissareiro de esperança, amigos, discos, livros e nada mais.